Dono de cobertura: Bumlai disse para ‘esquecer’ aluguel de Lula
Glaucos da Costamarques (Foto/Reprodução) |
Dono da cobertura vizinha à do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em São Bernardo do Campo (SP), alugada ao petista, o empresário Glaucos da Costamarques reafirmou ao juiz federal Sergio Moro nesta sexta-feira que não recebeu os aluguéis do imóvel entre fevereiro de 2011, quando o contrato de locação foi firmado, e novembro de 2015. Glaucos foi ouvido por Moro em um incidente de falsidade aberto a pedido do Ministério Público Federal (MPF) para apurar se são falsos os recibos dos pagamentos de aluguel apresentados pela defesa de Lula em um processo da Lava Jato.
O ex-presidente é réu pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro por supostamente ter recebido da Odebrecht 12,9 milhões de reais em propina, divididos entre as aquisições do apartamento no ABC paulista e de um imóvel que serviria como sede do Instituto Lula, em São Paulo. Segundo o MPF, Glaucos da Costamarques foi “laranja” da empreiteira na compra da cobertura, por 504.000 reais. Com os recibos, os advogados de Lula pretendem comprovar que ele pagou os aluguéis e, portanto, não é proprietário oculto do imóvel.
Glaucos afirmou a Sergio Moro que, para ele, a compra da cobertura teria funcionado como um “empréstimo” a seu primo, o pecuarista José Carlos Bumlai, amigo próximo de Lula. Conforme o empresário, Bumlai ficou lhe devendo o dinheiro investido no imóvel e os pagamentos do aluguel funcionariam como “correção” do valor. Ele relatou, no entanto, que o petista e a ex-primeira-dama Marisa Letícia Lula da Silva só pagaram o aluguel pela primeira vez em dezembro de 2015.
“O aluguel de fevereiro [de 2011], que vence dia 5 de março, eles não me pagaram. Esperei o aluguel de março, que vence dia 5 de abril, eles não me pagaram. Eu fui falar com o Zé Carlos [Bumlai], ‘olha eles não me pagaram o aluguel o que pode estar acontecendo?’ Ele falou: ‘Glaucos, esquece o aluguel’”, contou o empresário.
Questionado por Sergio Moro sobre o porquê de ter recolhido impostos sobre o recebimento dos aluguéis desde o início do contrato de locação, em fevereiro de 2011, se eles não foram quitados, Glaucos da Costamarques explicou que pagava as taxas porque foi informado por José Carlos Bumlai de que Lula e Marisa declarariam o pagamento dos aluguéis. Bumlai, de acordo com Glaucos, se comprometeu a ressarcir o valor pago nos impostos. O reembolso, ainda conforme o empresário, era feito de diversas formas, incluindo “venda de cavalos”.
“Além de eu não receber o aluguel, ainda vou pagar o imposto? Ele [Bumlai] falou ‘não, eu vou ressarcir esse imposto para você. Porque eles vão declarar que pagaram o aluguel e você vai ter que declarar que recebeu o aluguel, então eu vou te ressarcir esse imposto’”, afirmou. “O desenrolar da coisa foi o seguinte: na véspera de declaração de imposto de renda [de 2011], eles tinham que pegar o recibo e eu fiz, tenho a cópia, todos de 2011, de fevereiro, março, até dezembro. E eu assinei e entreguei para o contador dele, que era o João. E todo ano era isso”, completou.
Glaucos da Costamarques deu a mesma resposta sobre o recolhimento de impostos quando questionado sobre o e-mail encaminhado por ele ao contador João Muniz Leite, no qual informou sobre “aluguéis recebidos em 2013”. A mensagem foi incluída pelo advogado Roberto Teixeira, compadre de Lula, como prova de que os aluguéis foram pagos. Muniz Leite também foi ouvido por Moro nesta sexta-feira.
Visita de Roberto Teixeira
Glaucos da Costamarques também voltou a dizer a Sergio Moro que soube através de Roberto Teixeira, em novembro de 2015, que os aluguéis passariam a ser pagos regularmente dali em diante. O recado de Teixeira foi dado, segundo o empresário, enquanto Glaucos estava internado no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, para uma cirurgia cardíaca.
“Até aquela data [novembro de 2015], na minha cabeça, eu tinha comprado para o Zé Carlos [Bumlai] e ele estava me devendo esse dinheiro. Dali pra frente, que eu comecei a receber o aluguel e tudo, aí o apartamento era meu”, declarou o empresário.
Quando Moro citou que os registros de visitantes do Sírio-Libanês não apontaram nenhuma visita de Roberto Teixeira ao hospital no segundo semestre de 2015, Glaucos relatou que o advogado foi até o quarto onde ele estava internado. “Ele entrou sem se identificar. A entrada no hospital, onde a gente faz o crachá, é falha”, disse.
O empresário também reafirmou que, após a visita de Teixeira, recebeu João Muniz Leite no hospital e assinou, de uma só vez, recibos de aluguéis referentes a 2015, entregues pelo contador. A visita aconteceu uma semana depois da prisão de José Carlos Bumlai na Lava Jato. Glaucos negou que Muniz Leite tenha lhe prestado serviços e lembrou que o contador “fazia a declaração do ex-presidente e da dona Marisa”.
O empresário disse, no entanto, que não tratou com Roberto Teixeira sobre a visita de João Muniz Leite ao hospital, nem mesmo nas ligações telefônicas apresentadas pelo MPF como indícios de que eles podem ter tratado sobre o assunto. Os registros indicam que, no dia seguinte à prisão de Bumlai, 25 de novembro de 2015, Glaucos da Costamarques e Roberto Teixeira se falaram duas vezes ao telefone. Cerca de uma semana depois, entre os dias 3 e 4 de dezembro, foram registradas três visitas do contador João Muniz Leite a Costamarques, quando os recibos teriam sido assinados. Nos dias 5, 6, 14 e 17 de dezembro, o empresário e o compadre de Lula trocaram dez ligações.
Defesa de Lula
Por meio de nota, a defesa do ex-presidente Lula afirma que Glaucos da Costamarques “atestou que assinou os recibos de locação emitidos em favor de D. Marisa e que não houve emissão de todos os recibos de uma só vez”.
Sobre a negativa de Glaucos de que recebeu os aluguéis e a declaração de que classificava a compra do imóvel como “empréstimo” a José Carlos Bumlai, o advogado Cristiano Zanin Martins, que defende o petista, afirma que esta é a quinta versão apresentada pelo empresário. “Alegou, ainda, de forma contraditória, que se considera o proprietário do imóvel e que faz o pagamento de todos os impostos devidos pelo recebimento dos aluguéis”, diz o defensor.
(Veja.com)
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