É melhor financiar eleições com dinheiro da Odebrecht ou seu?
Urna eletrônica (Marcelo Camargo/Agência Brasil/Agência Brasil) Juristas comentam a intenção dos partidos de engordar o fundo partidário e sugerem alternativas |
São Paulo – O financiamento
público de campanha eleitoral pareceu ter surgido como uma panaceia para os
males da corrupção brasileira: proibindo a doação de empresas, a medida
coibiria as transações e transferências bilionárias descobertas nos
desdobramentos da Operação Lava Jato.
Com menos dinheiro do que
gostariam para fazer campanhas, os partidos políticos já começaram a articular
uma verba de R$ 3,5 bilhões para o fundo partidário, a conta conjunta que agora
financia o processo eleitoral – com dinheiro público.
A questão que fica é: foi mesmo
melhor proibir a doação de empresas para as campanhas eleitorais, deixando o encargo
para as pessoas físicas e o governo?
Especialistas ouvidos por
EXAME.com acreditam que apenas proibir o dinheiro empresarial nas campanhas não
é suficiente para resolver os problemas eleitorais brasileiros. Veja as
opiniões a seguir.
Combate à corrupção
Para Daniel Falcão, advogado e
professor de Direito da USP de Ribeirão Preto, o argumento do STF de que o
financiamento privado facilita a corrupção é falacioso, já que a questão
independe da fonte de financiamento.
“No Brasil, a legislação foca na
arrecadação, mas não nos gastos. Os escândalos mostram que a arrecadação foi
muitas vezes feita de forma legal, está lá declarado que o dinheiro saiu da
conta da empresa e entrou na da campanha”, diz. “Mas esse dinheiro foi gasto no
que?”
O raciocínio encontra eco no
estudo de Pedro Fernando Nery e Fernando B. Meneguin para o Senado, publicado
em 2015, no qual os pesquisadores usam a teoria dos jogos, da economia, para
mostrar que o financiamento público, por si só, não seria o suficiente para
acabar com a corrupção.
Pelos cálculos mostrados no
estudo, as empresas vão continuar dispostas a fazer doações ilegais se as
vantagens em contratos futuros e licitações continuarem sendo maiores do que a
possibilidade de ser pego e punido pela ilegalidade.
Do lado do candidato, a imposição
de um limite nos gastos de campanha também funciona como incentivo para o
recebimento de doações ilegais de empresas. Segundo a teoria, é preciso fazer
com que a percepção da perda supere a percepção de ganhos, aumentando a fiscalização
e criando um movimento de boicote entre eleitores.
Democracia e pluralidade
O pesquisador da FGV e professor
de Direito do Mackenzie Diogo Rais afirma que o financiamento público é um
gasto desnecessário e que não garante mais democracia.
“O dinheiro sai de uma estrutura
orçamentária deficiente e entra numa estrutura sobre a qual não temos controle,
que é o partido político. Se eu coloco o dinheiro na mão do partido e ele tem
carta branca para usá-lo como quiser, não quer dizer que a democracia está
sendo garantida”, explica.
Ele acrescenta que o modelo pode
deixar as candidaturas menos consolidadas dentro dos partidos ainda mais
frágeis. “Quem já não tiver prestígio dentro do partido vai ter pouca chance de
se viabilizar.”
Mas uma mudança nessa dinâmica
teria de implicar uma legislação sobre as estruturas partidárias, que é um
ponto que divide a classe jurídica, de acordo com Rais. Além disso, o
financiamento público também tem potencial para tornar a competição entre os
partidos mais injusta: quem já tem representatividade vai garantir mais; quem
tem pouca, tende a sumir.
Isso porque, atualmente, 5% do
dinheiro do fundo partidário é distribuído de forma igualitária a todos os
partidos brasileiros; os outros 95% são distribuídos na proporção dos votos
obtidos na última eleição geral para a Câmara dos Deputados.
Na proposta de criação de um
fundo de R$ 3,5 bilhões, metade do dinheiro iria para todos os partidos
igualmente, e a outra metade seria distribuída por representatividade.
Pela nova proposta, partidos que
hoje apoiam o governo Temer garantiriam 60% do dinheiro.
Fiscalização e continuidade das
reformas
Mesmo quem defende o
financiamento público, como é o caso do especialista em direito eleitoral
Guilherme Pessoa Franco de Camargo, cita a necessidade de mudanças no modelo
atual. Camargo é favorável ao financiamento público de campanha, afirmando que
quando os recursos veem de um único fundo, é mais fácil de fiscalizar a
destinação.
Em uma próxima etapa, no entanto,
Camargo defende uma reforma que mude o sistema eleitoral brasileiro para cortar
os custos de campanha, como a adoção da lista fechada ou do voto distrital, por
exemplo. Por um lado, a lista fechada poderia tornar os gastos dos partidos
mais direcionados, mas traria problemas, como um ciclo vicioso cada vez menos
arejado na política brasileira.
O voto distrital, por sua vez,
poderia aproximar os candidatos de seus eleitores, enquanto cortaria gastos de
campanha, como exemplifica Daniel Falcão: “é diferente o candidato se deslocar
em seu distrito de ter de percorrer todo o estado durante uma campanha”.
(Fonte: EXAMA.com)
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