Crise de crédito tirou R$ 1 trilhão da economia e aprofunda recessão
Foto: Agência Brasil |
Nos últimos 12 meses, cerca de R$ 1 trilhão deixou de circular na
economia brasileira. Essa montanha de dinheiro equivale aos créditos
bancários que foram sendo pagos pelos devedores e não retornaram ao
mercado na forma de novos empréstimos, bem como à expansão natural do
mercado, que não ocorreu. Isso significa uma queda de 25% em relação ao
que deveria estar circulando se a economia estivesse operando em níveis
"normais". O volume de crédito bancário que gira na economia hoje é
equivalente ao disponível em 2012. Para os especialistas, isso mostra
que o Brasil vive uma "crise de crédito" e não sairá da recessão se esse
nó não for desatado. O levantamento foi feito pela gestora de recursos
Rio Bravo Investimentos, com base nas variações do estoque de crédito
monitorado e divulgado pelo Banco Central. O curioso é saber o que
motivou o levantamento. O economista da Rio Bravo, Evandro Buccini,
ficou incomodado porque os indicadores de confiança na economia
permaneciam otimistas, mas os índices sobre a situação atual não
melhoravam. E pior: a recessão se aprofundava. "Fomos checar as
componentes do nosso modelo, que traça cenários, e nos deparamos com
essa queda no crédito. Está explicado: sem crédito, sem dinheiro, a
economia não vai mesmo reagir", diz. Segundo Buccini, a partir desse
dado, fica mais claro que, apesar de União, Estados e municípios estarem
com sérios problemas nas contas públicas, que precisam ser sanados, o
fiscal não é cerne da recessão. O que vem corroendo a economia é o que a
literatura econômica chama de "credit crunch", crise de crédito. No
caso do Brasil, originada e realimentada pela explosão das dívidas. A
economista Zeina Latif, da XP investimentos, há meses alertava para essa
questão e lembra que o enrosco tem duas pontas.
Reunião do Conselhão, já na gestão Temer | Foto: Marcos Corrêa / PR
De um lado estão devedores enforcados. Cerca de 22% do orçamento
familiar está comprometido com o pagamento de juros de dívidas e
praticamente metade das empresas tem geração de caixa inferior às suas
despesas financeiras. Ou seja: os tomadores de crédito precisam digerir
altas concentrações de dívidas. De outro lado estão os bancos, que já
renegociaram débitos, ainda temem o calote e não querem - nem podem -
correr o risco de emprestar mais em meio a uma recessão sem prazo para
terminar. Trata-se exatamente do que parece ser: um círculo vicioso, que
só vai se encerrar com o pagamento das dívidas. Quando Zeina falou na
primeira reunião do Conselhão, em Brasília, que a "lua de mel" com o
mercado estava em risco, e o governo precisava ser mais ágil para
reanimar a economia, tratava, em parte, dessa questão. "Apesar de o
fiscal exigir atenção, também temos uma crise de crédito que pode até
evoluir para risco de insolvência (termo financeiro que significa risco
de os devedores darem calote)", diz ela. O minipacote anunciado na
semana passada, se for efetivado, pode dar alívio, mas está longe de
resolver o problema, diz Zeina. Monica de Bolle, pesquisadora do
Instituto Peterson de Economia Internacional, em Washington, dedicou um
recente artigo no Estado sobre o tema e reforça: "O diagnóstico sobre as
causas da recessão estava errado: o Brasil sofre com uma crise de
crédito. Todos estão muito endividados: famílias, empresas, municípios,
Estados e, inclusive, a União." Ela lembra que o tempo de digestão de
altas concentrações de dívidas pode ser longo e penoso. O que acelera o
alívio é uma eventual intervenção dos governos. Guardando-se as devidas
proporções, Monica lembra que os Estados Unidos viveram um "credit
crunch" com o estouro da bolha imobiliária, em 2008. A diferença é que
lá os bancos foram arrastados, o que não ocorreu aqui, pelo menos até
agora. Para sair dela, o governo americano gastou US$ 850 bilhões para
socorrer bancos e empresas, mais US$ 4 trilhões com o "quantitative
easing", programa de aquisição de títulos soberanos lastreados em
hipotecas, e derrubou o juro a 0,25% - até a semana passada. A economia
americana agora entra nos eixos - oito anos e US$ 5 trilhões depois.
"Sem chance de o Brasil, neste momento, fazer algo minimamente
parecido", diz Mônica.
por Alexa Salomão | Estadão Conteúdo
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