O papel social das rádios comunitárias
As rádios comunitárias tem um grande papel social nas comunidades em que são veiculadas por identificarem um grupo de pessoas, a partir de seus problemas locais, cultura própria e realidade social. O foco principal desse estudo é quando essas mídias preservam o interesse social vinculado à realidade local, levando a comunidade a reconhecer a rádio como sendo sua, criando uma identidade. A radiodifusão comunitária representa uma conquista dos movimentos populares em relação ao acesso aos meios de comunicação. Tais rádios apresentam diversas vantagens para a população local, desde a informação, a educação informal, sua cultura própria, a participação ativa das pessoas da comunidade e de representantes de movimentos sociais e outras formas de organização coletiva na programação, dos processos de criação e planejamento até a gestão da emissora. Uma característica importante dessas rádios é o exercício da cidadania, representando um canal aberto à liberdade de expressão, independentemente de suas convicções políticas, credos religiosos, escolaridade, qualidade de voz etc.
Historicamente, no Brasil, a rádio comunitária tem sido canal de expressão da população empobrecida que, por meio de suas organizações sociais, desenvolve um trabalho de informação, educação informal, desenvolvimento cultural e mobilização das pessoas visando à melhoria nas condições de existência. No seu processo de ação, em geral conectado às lutas sociais mais amplas em cada lugar, a emissora comunitária tende a contribuir para a mobilização social e trabalho organizativo local com o intuito de melhorar serviços públicos, desenvolver trabalhos educativos contra a violência, difundir produtos artísticos de membros da "comunidade", além de desencadear possibilidades de educação informal e não-formal.
Ameaça às emissoras convencionais
Há evidências concretas em várias experiências de que ao se envolver na dinâmica radiofônica a pessoa se desenvolve, aprende a falar em público, a externar conhecimentos, dons e criações artísticas, a compreender melhor o jogo de interesses internos e externos a que a mídia está sujeita, bem como a reconhecer a realidade que a cerca e se interessar em contribuir para mudanças. No meio de tantas descobertas melhora a auto-estima e a esperança tende a brotar ou se renovar. Por vezes, as pessoas, principalmente as mais jovens, são despertadas para estudar comunicação em faculdades da área e descobrem aptidões profissionais antes não imaginadas. Outros redescobrem um sentido para suas vidas (PERUZZO, 2002-2005).
A mídia comunitária também promove a conscientização da população de seus direitos e deveres, dando a oportunidade de lutar por eles, através de um novo olhar em relação ao mundo. O indivíduo passa a sentir-se importante, por assumir o papel de titular das discussões, debates e produção de conteúdo; no entanto, esse desenvolvimento social não interessa a todos os setores da sociedade.
Justamente por representar uma conquista do acesso aos meios de comunicação por parte dos movimentos populares, a radiodifusão comunitária também é vista como uma ameaça às emissoras convencionais e até ao governo, por formar uma possibilidade diferenciada de comunicação que chegue próximo a um grupo social muitas vezes deixado de lado. As emissoras convencionais temem perder público e anunciantes, enquanto o governo reconhece que tais mídias comunitárias "são portadoras de um certo conteúdo político que amedronta os três poderes constituídos" (PERUZZO, 1998b, p.7).
Engavetando divulgação de relatório
No Brasil, as rádios comunitárias passaram a ser legalizadas com a aprovação do Congresso, mesmo sendo uma das poucas formas viáveis de comunicação da população. Apesar da legalidade aparente, a liberação das rádios é lenta e muitas acabam trabalhando sem a autorização do governo e acabam sendo fechadas – o que ocorreu com várias rádios do Brasil nos últimos anos. Num momento em que o país passa por uma onda de violência urbana, é reprimida uma iniciativa que colabora no fortalecimento das lutas populares e na organização da sociedade por meio da difusão de valores como a solidariedade e a justiça (PERUZZO).
Podemos observar que as rádios comunitárias vêm sendo tratadas como caso político e caso de polícia, como analisa Peruzzo. As evidências estão nas ações da Anatel e da Polícia Federal no cerceamento à liberdade de expressão, sem levar em conta o papel social das rádios comunitárias; na morosidade com que os processos são analisados e julgados; nas outorgas concedidas por influências do lobby de grupos ligados a políticos e igrejas; e no tratamento dado pelo Ministério das Comunicações, engavetando e dificultando a divulgação do relatório final elaborado, certamente por acatar várias das reivindicações do movimento de rádios comunitárias do país e recomendar a disseminação deste tipo de emissora no Brasil.
Força e identidade
Na perspectiva legal do poder concedente, uma rádio comunitária tem como objetivo proporcionar informação, cultura, entretenimento e lazer a pequenas comunidades: Uma rádio comunitária deve divulgar a cultura, o convívio social e os eventos locais; noticiar os acontecimentos comunitários e de utilidade pública; promover atividades educacionais e outras para a melhoria das condições de vida da população [...]. A programação diária de uma rádio comunitária deve conter informação, lazer, manifestações culturais, artísticas, folclóricas. Deve estimular tudo aquilo que possa contribuir para o desenvolvimento da comunidade, sem discriminação de raça, religião, sexo, convicções político-partidárias e condições sociais. Deve respeitar sempre os valores éticos e sociais da pessoa e da família e dar oportunidade à manifestação das diferentes opiniões sobre o mesmo assunto (BRASIL, 2006).
Conclui-se que essa comunicação, também chamada de popular, participativa ou alternativa, tem como finalidade o desenvolvimento de suas capacidades intelectuais, artísticas e de convívio social, além de aprimorar suas atividades profissionais e melhorar sua condição de existência. O papel principal das rádios comunitárias é transformar os indivíduos de uma comunidade em cidadãos participativos, que busquem melhorar sua condição social, que tenham certo conhecimento político e cultural e que saiba lutar por seus direitos. Além de apresentar também alternativas, oportunidades e organização de um grupo, muitas vezes deixado de lado, ganhando assim, força e identidade, levando esse grupo a exercer a conhecer o papel da cidadania e participar dela.
Graduada em Jornalismo pela Unesp, Bauru, SP
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