Abordagem Policial

Recentemente, a imprensa noticiou que policiais civis dispararam contra um carro, em plena via pública, porque suspeitaram que o veículo estava sendo conduzido por bandidos. A suspeita dos policiais, segundo o que foi noticiado, se baseou nos seguintes elementos: era um carro importado, com película nos vidros e que se deslocava em alta velocidade. Os policiais em questão estavam à paisana e conduziam um carro sem qualquer identificação da corporação. Resultado da operação: no carro alvejado encontrava-se um advogado e sua esposa, que ao perceberem a aproximação de um veiculo não identificado pensaram que era um assalto e evadiram-se. Os policiais agiram dentro da legalidade ao disparar contra um veículo por simples suspeita? A abordagem policial, como todo ato administrativo, possui os atributos da imperatividade, coercibilidade e autoexecutoriedade, isto é, impõe-se de forma coercitiva, independentemente de concordância do cidadão, e são realizadas de ofício, a partir de circunstâncias determinantes, sem necessidade de intervenção do Poder Judiciário. Mas para que abordagem policial possa se revestir de legalidade, é preciso que haja fundada suspeita, como determina a regra do artigo 244 do CPP, in verbis: . A busca pessoal independerá de mandado, no caso de prisão ou quando houver fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito, ou quando a medida for determinada no curso de busca domiciliar. Somente é permitida a abordagem e a busca pessoal diante de uma suspeita fundamentada, palpável, baseada em algo concreto. A suspeita é uma desconfiança ou suposição, algo intuitivo e frágil por natureza, razão pela qual a norma exige a "fundada suspeita", que é mais concreta e segura.



A “fundada suspeita”, prevista no art. 244 do CPP, não pode fundar-se em parâmetros unicamente subjetivos, exigindo elementos concretos que indiquem a necessidade da abordagem, em face do constrangimento que causa. Evidentemente que não se pode ter por configurada a “fundada suspeita” na alegação de que se tratava de um carro importado, com película nos vidros e conduzido em alta velocidade. Para que houvesse fundada suspeita, deveria haver alguma denúncia ou informação da Central de Polícia de que o carro tinha sido tomado de assalto ou de que tinha sido utilizado em alguma ação delituosa. Não aconteceu nada disso. Se a lei fala que a abordagem policial somente deve ser realizada diante de uma "fundada suspeita", cabe aos policiais agirem de acordo com a norma legal, pois vivemos num Estado Democrático de Direito, onde nossas ações são rigorosamente disciplinadas por regras jurídicas. Certamente que abordagens e operações da policia trazem benefícios para a comunidade, sendo uns dos meios que mais tiram cidadãos infratores das ruas. Sem dúvida. Mas a lei deve ser respeitada. No caso específico, os policiais civis, por simples suspeita, atiraram contra o carro de um cidadão e por muito pouco não provocaram uma tragédia. Agiram de forma totalmente desastrosa, numa ação marcada pela mais escandalosa ilegalidade. Evidentemente que não se pode culpar toda uma corporação pela atitude desastrada de alguns de seus membros. Exige-se, contudo, que os dirigentes dessa mesma corporação sejam implacáveis na apuração e punição rigorosa daqueles que não agirem de acordo com a lei. Mas não é só. É necessário, antes de tudo, que as academias de polícia estejam preparadas para ministrar aos policias uma sólida formação profissional, especialmente no que concerne aos direitos e garantias fundamentais. A cidadania agradece.






Nei Viana Costa Pinto



Secretário Geral da OAB-BA






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