Rompido com os líderes do PT e do PL, o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), organizou um bloco parlamentar com 275 deputados, a maioria da Casa, para sustentar sua governabilidade e se fortalecer no embate com o governo Lula e a oposição.
O movimento também é visto por parlamentares como um passo inicial para Motta construir uma base de apoio que o reeleja em 2027, apesar de dissidências internas.
O bloco é parte do grupo que apoiou sua candidatura à presidência da Câmara em fevereiro, quando ele foi eleito com 444 votos, mas estava esvaziado desde o começo do ano, com a saída de algumas siglas, como Solidariedade, Patriota e Avante, além do próprio PT e do PL.
No fim de outubro, diante das dificuldades para tocar a pauta e do estremecimento na relação com PT e PL, Motta reuniu os partidos de centro-direita para reorganizar o bloco parlamentar, com o compromisso de um revezamento entre os partidos na liderança do grupo e o compromisso de que ele se mantenha unido até dezembro de 2026.
Em agosto, o PT já havia formalizado sua saída do bloco, após o governo ser derrotado numa manobra na CPI do INSS que garantiu que oposicionistas ocupassem os principais cargos do colegiado. Naquele momento, de acordo com relatos, a ministra Gleisi Hoffmann (Secretaria de Relações Institucionais) chegou a procurar líderes aliados estimulando que eles também deixassem o bloco.
Segundo um líder que acompanhou as conversas, a ministra foi avisada quando as conversas para a organização do novo grupo de Motta foram concluídas.
Fazem parte do bloco de sustentação o presidente da Câmara os partidos União Brasil, PP, PSD, Republicanos, MDB, a federação PSDB/Cidadania e o Podemos. Juntos, eles somam 275 dos 513 deputados da Câmara. Com isso, o grupo é capaz de apresentar requerimentos de urgência e aprová-los sem a necessidade de apoio da esquerda ou da direita, por exemplo.
O primeiro líder anunciado do bloco foi Pedro Lucas Fernandes (União Brasil-MA). Agora, o posto já é ocupado por Doutor Luizinho (PP-RJ). Haverá um revezamento de cerca de 30 dias cada. O líder é o responsável por assinar os requerimentos e discursar em nome da bancada no plenário.
Para se ter uma ideia do tamanho do bloco, são 63 vice-líderes (deputados que podem representar o grupo na ausência do líder). Esse número é maior do que quase todos os partidos da Câmara, com exceção de PL e PT.
Foi essa base de apoio que permitiu a Motta aprovar o projeto de lei antifacção mesmo com a oposição e com o governo trabalhando contra. O PT atacou o presidente da Câmara pela escolha do relator, o deputado Guilherme Derrite (PP-SP), e por mudanças no texto, que era a principal aposta do presidente Lula para a pauta da segurança pública.
Já o PL insistiu em votar uma emenda para classificar facções criminosas como grupos terroristas, ideia que Motta e o relator tinham abandonado após críticas de especialistas e de integrantes do mercado financeiro, que apontaram risco para as investigações em curso e de uma fuga de investimentos do país.
A Câmara aprovou o projeto por 370 votos a 110 na semana passada, a despeito da posição contrária do governo. A emenda sobre o terrorismo foi rejeitada de ofício por Motta, que a considerou inconstitucional e não a submeteu à votação.
Foi esse mesmo projeto que levou ao rompimento do presidente da Câmara com o líder do PT, Lindbergh Farias (RJ), e um estremecimento na relação dele com o líder do PL, Sóstenes Cavalcante (RJ).
Motta disse à Folha que não tinha "mais interesse em ter nenhum tipo de relação com o deputado Lindbergh Farias". No caso do PL, houve desentendimento porque o presidente da Câmara se queixou ao deputado da insistência dele em seguir atuando pela emenda sobre o terrorismo.
Como mostrou a coluna Mônica Bergamo, Motta enviou uma mensagem de WhatsApp para Sóstenes, afirmando que o parlamentar não poderia mais contar com o presidente da Câmara. Os dois não se falam há uma semana.
Na avaliação de deputados, com esse movimento de se afastar de Lindbergh e Sóstenes, Motta acaba se isolando de dois partidos que foram importantes para sua eleição e detentores das maiores bancadas da Casa. Além disso, nomes do centrão afirmam que o presidente da Câmara tem diminuído seu grupo de aliados de primeira hora. Eles citam como exemplo o afastamento entre Motta e seu antecessor, Arthur Lira (PP-AL).
Parlamentares afirmam que a construção do bloco é uma forma também de Motta começar a organizar sua base para disputar à reeleição para a presidência da Câmara, em 1º de fevereiro de 2027. O grupo, se mantido unido, daria uma margem de largada importante contra as pressões do PT e do PL, seja qual for o presidente da República eleito.
Parte dos aliados de Motta nega que o bloco tenha a eleição legislativa como pano de fundo. "Não houve discussão de eleição de presidente na Câmara. Ainda falta muito tempo, temos uma eleição no meio. Ninguém sabe quem serão os eleitores da próxima Mesa Diretora", diz o líder do MDB, Isnaldo Bulhões Jr. (AL), um dos principais aliados de Motta.
Outra ala diz que o bloco parlamentar tem esse objetivo, mas que o presidente da Câmara precisa se mostrar viável ao fim do mandato para debelar as dissidências internas, e que também é preciso aguardar o tamanho que cada partido sairá das urnas.
Nos bastidores, são citados como possíveis candidatos ao comando da Câmara os deputados Antonio Brito (PSD-BA), Doutor Luizinho (PP-RJ), Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), Altineu Côrtes (PL-RJ) e o próprio Isnaldo. O nome de Lira também não é descartado, mas aliados do parlamentar negam a possibilidade e afirmam que ele deverá ser candidato ao Senado no próximo ano.
Por Victoria Azevedo e Raphael Di Cunto, Folhapress

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