O governo brasileiro pode ter dificuldade de obter a extradição do deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) para que ele cumpra pena por ter participado da trama golpista de 2022.
Especialistas ouvidos pela Folha apontam obstáculos que podem vir de aspectos jurídicos, em razão do tratado de extradição entre Brasil e Estados Unidos, e de questões políticas.
Ramagem foi condenado a 16 anos e um mês de prisão pelos crimes de organização criminosa armada, golpe de Estado e tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito.
Após decisão da Câmara, ficou suspensa parte da ação penal, que avaliava os crimes de dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado, referentes a fatos ocorridos após a diplomação do parlamentar.
Nesta terça-feira (25), o relator do processo no STF, Alexandre de Moraes, determinou o início do cumprimento da pena do deputado, que está nos Estados Unidos desde setembro.
O ministro apontou que o deputado é considerado foragido e determinou a expedição do mandado de prisão e inserção no BNMP (Banco Nacional do Monitoramento de Prisões). Determinou ainda perda de mandato parlamentar e do cargo de delegado da Polícia Federal, inelegibilidade e suspensão dos direitos políticos.
No sábado (22), Ramagem disse que não ficaria no Brasil porque seria preso "sem ter cometido crime algum e sofrendo diante de uma ditadura".
Um dia antes, Moraes havia decretado a prisão preventiva do deputado para evitar risco à aplicação da lei penal.
Para Diego Nunes, professor de direito da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), não há, por ora, possibilidade jurídica para a extradição de Ramagem, porque os crimes pelos quais ele foi condenado não estão previstos no tratado entre Brasil e Estados Unidos.
Ele afirma que o único delito que poderia se aproximar daqueles presentes no tratado é o crime de dano, suspenso no caso de Ramagem. Ainda assim, ressalta, há diferenças, pois o tratado, diferentemente do Código Penal, prevê que o dano tenha como objetivo causar perigo a outras pessoas e "se aproxima de tipos penais brasileiros sobre sabotagem ou dispositivos sobre terrorismo".
Com isso, conclui, não existiria possibilidade de Ramagem ser extraditado pelos crimes da trama golpista. O que pode acontecer, diz, é eventual deportação caso ele não tenha visto ou outra permissão para ficar no país, como aconteceu com outros condenados pelo 8 de Janeiro.
Segundo Raphael Rocha, professor de direito da Universidade Federal de Juiz de Fora, o aspecto político também pode dificultar a extradição.
"O governo Trump tem mantido uma postura dúbia em relação a esses assuntos. Ele está voltando atrás de algumas decisões que vinha tomando, em matéria tarifária, mas mantém algumas sanções de cunho político, como a Lei Magnitsky, que continua em vigor contra, por exemplo, Alexandre de Moraes. Não existe uma posição clara sobre a visão política do governo norte-americano sobre esse assunto", diz.
Segundo Rocha, depois de comunicada a condenação pelo Judiciário, o Ministério da Justiça e Segurança Pública formula um pedido de extradição. A documentação é remetida a um órgão da Secretaria Nacional de Justiça, responsável por intermediar o procedimento junto ao Ministério das Relações Exteriores. Este, por sua vez, estabelece o contato diplomático com a autoridade estrangeira responsável.
Para ele, o mais plausível é que a jurisdição brasileira adote mecanismos alternativos de coerção, como a decretação da perda de mandato eletivo, já objeto da decisão de Moraes, ou a imposição de sanções financeiras, para pressionar pelo retorno voluntário de Ramagem.
O professor lembra ainda que o parlamentar pode argumentar que sua condenação deriva de crime de caráter político, uma vez que há restrições internacionais à entrega de indivíduos por delitos dessa natureza.
Evandro Carvalho, professor de direito internacional da Fundação Getúlio Vargas e da UFF (Universidade Federal Fluminense), lembra que um pedido de extradição não é automático. O governo dos EUA avaliará, diz, se os fatos que fundamentam a decisão também constituem crime no país e se a Justiça brasileira observou o devido processo legal.
Para ele, não é possível afirmar que a extradição ocorrerá "facilmente", pois cada pedido passa por análise judicial e administrativa nos EUA. "Mas também não se pode dizer que seja improvável: o tratado existe, os crimes são graves e há precedentes de cooperação entre os dois países", diz.
Por Ana Gabriela e Oliveira Lima, Folhapress

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